A Língua Brasileira de Sinais, conhecida também como Libras, é a segunda língua oficial do nosso país e é usada na comunicação de pessoas com deficiência auditiva. A Lei 10.436, de 24 de abril de 2002, foi criada a fim de reconhecer a Língua Brasileira de Sinais como meio legal de comunicação de pessoas surdas. Pensando nisso, entrevistamos Roberta Martins Miranda, de 41 anos, professora de Física, na E.E. Narciso Pieroni, de Matemática e Física, no Colégio Horizonte e intérprete de Libras, para nos responder algumas questões referentes à inclusão social e ao acesso à Educação de surdos. Roberta é formada em Tecnologia em Construção Civil (edifícios) pela FATEC- SP e em Licenciatura em Física no IFUSP (Universidade de São Paulo). Pós-graduada em Intérprete de Libras – Língua Brasileira de Sinais.
Como trabalhar com a Língua Brasileira de Sinais tornou-se profissão?
No último ano de licenciatura procurei uma escola estadual próxima à minha casa, em São Paulo, para fazer estágio e me deparei com uma escola de inclusão de surdos, na qual tinha uma sala de recursos com intérprete de Libras, a E.E. Roldão Lopes de Barros. As turmas eram de Ensino Médio e tinham aproximadamente 3 a 5 surdos por sala, junto com mais 30 alunos ouvintes, dificultando ainda mais o ensino de qualquer disciplina. Ao me formar e ser convocada para assumir um cargo efetivo na rede estadual, a minha primeira opção foi essa escola, pelo trabalho diferenciado e, com isso, comecei a fazer cursos paralelos de Libras. Com o contato direto que tive com esses alunos e mais o aprimoramento em Libras, nos cursos com a professora Sueli Ramalho, com quem pude conhecer um pouco da cultura do surdo, iniciei o Mestrado em Ensino de Física Moderna para alunos surdos. Comecei trabalhando como intérprete em Olimpíadas de Matemática e Física. Em Socorro, pude lecionar o curso de Libras básico pelo Senai e atuar como intérprete no ENEM em 2015 e 2017.
A estrutura para esse tipo de ensino no Brasil ainda é escassa? Por quê?
Atualmente, o ensino de Libras é obrigatório nos cursos de graduação em licenciatura, nos quais, em um semestre, os alunos conseguem ter um contato básico com a língua que, oficialmente, é a 2ª língua no Brasil. Com um semestre, dificilmente haverá possibilidade de comunicação com algum surdo; é necessário contato com eles, conhecimento da sua cultura e prática da língua. A Língua Brasileira de Sinais não é como muitos acreditam, saber o alfabeto só facilita na digitação (soletrar) de uma palavra ou nome; a gramática é diferente, palavras têm sinais diferentes, dependendo do contexto. Além disso, ainda existe o regionalismo, onde a mesma palavra possui sinais diferentes em SP, RJ e MG. Para aprender Libras é necessária muita prática, memória visual e uma constante atualização.
Quais os desafios do ensino de Libras? É difícil aprender?
O ideal seria que o surdo iniciasse sua vida acadêmica em escola bilíngue, onde aprende Português e Libras desde pequeno, especialmente se não tiver contato com a Libras, em sua família. Em São Paulo existem escolas municipais e particulares que oferecem esse tipo de ensino, mas a família deve estar ciente dessa importância e procurar seus direitos. Aqui em Socorro isto não existe, a família consegue, no máximo, uma fonoaudióloga que pode ajudar na Libras. Como a Libras é uma língua visual, a comunicação escrita é muito difícil para os surdos e, por isso, não adianta escrever algo, achando que, se ele não escuta, lendo, ele vai entender.
Como é trabalhar com Libras aqui em Socorro, uma cidade considerada referência pelo Turismo Acessível?
Ser intérprete em Socorro é bem diferente de ser intérprete em São Paulo, porque aqui na cidade a maioria dos surdos não utiliza somente Libras, mas também muitos sinais caseiros, dificultando a comunicação. No curso que dei no Senai tinha 3 alunos surdos e percebi que conheciam muitos sinais, mas não sabiam seu significado e muito menos a escrita.
Se nem os surdos sabem Libras, como a cidade pode ser acessível? No curso que dei havia alguns profissionais de escolas e hotéis, que espero ter auxiliado na iniciação da língua, mas a falta de prática e a falta de fluência, como qualquer língua, contribuem para o esquecimento.
Como a população pode ajudar na inclusão social?
Não basta dar acesso, é necessário incluir social e culturalmente, fornecendo condições para que possam usufruir das mesmas estruturas de outra pessoa qualquer. Um surdo tem direito a se matricular e cursar qualquer curso na escola ou faculdade, ou seja, tem o acesso. Isto garante que ele terá condições de acompanhar e aprender como um aluno ouvinte? Ele pode ir ao cinema, mas o filme dublado não lhe traz informação nenhuma e um filme legendado em português, também é de difícil compreensão, pois não é sua língua.
No ENEM ele tem direito a intérpretes, mas isso é o suficiente para poder realizar a prova? É como fazer uma prova toda em uma língua desconhecida. A prova deveria ser preparada em Libras, em vídeo e com acesso a um intérprete.