A Campanha da Fraternidade 2020 tem como tema “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso” e seu lema: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele”. Há cinquenta e oito anos, os cristãos católicos brasileiros são chamados a fazer parte da Campanha da Fraternidade, realizada durante a Quaresma. Outras denominações cristãs também participam, a cada cinco anos, de forma ecumênica. Conversamos com os padres Francisco Gilson de Souza Lima e Nei de Oliveira Preto, para nos explicar qual a importância da campanha na vida social dos fiéis e a importância da Quaresma.
Nas palavras do padre Francisco Gilson:
O senhor poderia explicar o tema da Campanha da Fraternidade 2020 “Fraternidade e Vida: Dom e Compromisso” e também o lema: “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele”?
O tema deste ano “Fraternidade e Vida: dom e compromisso” e seu lema “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” são inspirados na parábola do Bom Samaritano (cf. Lc 16,19-31). Eles nos desafiam a romper com o “verme” da indiferença e sermos promotores da vida. A pobreza, a devastação ambiental e a violência são realidades que percebemos crescer a cada dia ao nosso redor, parecendo, às vezes, que não têm solução. Mas, essas e outras situações são todas decorrentes da indiferença. Quando finjo que não vejo, quando finjo que não me diz respeito, quando fico de braços cruzados; ou seja, quando sou indiferente, o mal se alastra. Romper com a raiz da maldade é a única solução para que tenhamos “vida em abundância” (cf. Jo 10,10).
Como foi o início da campanha na Quarta-feira de Cinzas?
Em nossa Paróquia, a abertura da Campanha se deu na missa das 19h30. Durante esse tempo quaresmal, que se estende até a tarde da Quinta-feira Santa – apesar de que a Campanha se encerra no Domingo de Ramos da Paixão do Senhor que esse ano será em 05 de abril -, propomos aos fiéis um encontro semanal de reflexão e oração. Nesse encontro, usamos o material promovido pela Regional Sul II da CNBB (Paraná) e a meditação da Via-Sacra, também chamada Caminho da Cruz. Todos refletimos, tanto no encontro semanal nas casas, quanto na Via Sacra, na Igreja, pois Jesus de Nazaré nos chama à vida. Sua morte foi para que nós tivéssemos a possibilidade de vivermos sua vida celeste. Não somente nós, seres humanos, mas toda Criação. Após esse período, outras ações concretas podem surgir da reflexão e vivência quaresmal.
Como a Campanha da Fraternidade aproxima os fiéis dos problemas sociais?
Essa questão é muito interessante, sobretudo porque ainda há aqueles que dizem que o Estado é laico e, por isso, a Igreja deve se restringir ao ambiente da fé. Contudo, quando o Estado não consegue atender a demanda é à Igreja, e a outras instituições, sem dúvida, que as pessoas acorrem pedindo ajuda, quer para alimento, quer para remédio e até mesmo moradia. Não conseguimos atender a todos e suprimir todas as necessidades; mas, para nós católicos, apesar de que nem todos têm ainda esse entendimento, a fé e a sociedade não são concorrentes e sim se interpelam. São Tiago, em sua Carta, ensina-nos que a verdadeira religião não se faz indiferente aos problemas sociais (cf. Tg 1,27; 2,14-17) e que a verdadeira fé sem as obras é morta (cf. Tg 2,26). Diz o provérbio popular: “O que os olhos não veem, o coração não sente”. É por isso que muitos fingem não ver, para não sentirem; e se não sentem (compaixão), não cuidam. Então, a Campanha desse ano quer nos fazer passar do indiferentismo à Fraternidade. Somente somos capazes de cuidar se não fingirmos mais que não vemos a dor do outro, se nos abaixarmos, se tivermos a coragem de tocar. Poderíamos acrescentar ao lema o verbo tocar: “Viu, sentiu compaixão, tocou e cuidou dele”. Não tenhamos medo do “toque” que nos humaniza.
Algo mais?
A Campanha da Fraternidade é própria do Brasil e se iniciou em 1962. Já são 58 anos de reflexão, ajudando nossos fiéis, bem como a Sociedade como um todo, a pensar no próximo e no mundo que nos circunda. A coleta da Campanha, que se realiza no dia do Domingo de Ramos da Paixão do Senhor, comumente chamado apenas Domingo de Ramos, tem como destino os Fundos de Solidariedades (60% para o fundo diocesano e 40% para o fundo nacional, administrado por uma comissão especial da CNBB). Muitos dizem: “Nada muda com essas campanhas!”, mas são aproximadamente 200 projetos assistidos a cada ano e que podem ser consultados por todos que tiverem interesse. Na Igreja surge cada vez mais grupos que reivindicam de tudo para satisfação própria. Reivindiquemos menos e façamos mais em comunhão.
Quaresma: tempo de preparação para celebrar a Páscoa
“Da quarta-feira de cinzas até a quinta-feira santa, no momento que antecede a “Missa da Ceia do Senhor” (lava-pés), celebramos o tempo litúrgico da quaresma. A quaresma da Igreja Católica está relacionada com modelos bíblicos. Os quarenta dias de Moisés no deserto (Ex 24, 12-18.34) e os quarenta dias de Elias (1Rs 19, 3-8), e os quarenta dias de Jesus no deserto (Mt 4, 1-11). Como nos diz São Paulo: “Pois, Ele (Cristo) nos diz: ‘no momento favorável eu te ouvi, no dia da salvação eu te socorri’. É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação” (2 Cor 6,2).
A cada ano vivenciamos o tempo quaresmal, entendemos que esse tempo de quarenta dias é um tempo oferecido por Deus para fazermos a nossa preparação para celebrarmos a Páscoa. É um tempo de mais atenção à Palavra de Deus, de mais oração, de reconciliação com Deus, através do sacramento da penitência, e de reconciliação com os irmãos, através das obras de misericórdia: jejuns, orações e caridade. Tempo de reafirmarmos nosso compromisso batismal e conversão de vida. Tempo de mais vida fraterna, mais comunidade e menos individualismo.
O sentido do deserto bíblico é um desafio para nós, que nos dias atuais vivemos na agitação e no barulho de tantas situações no cotidiano. Mas, quem se propõe a não deixar a quaresma passar em vão, deve guardar para si momentos de silêncio, de oração, de introspecção para ouvir a voz de Deus. Deve não se ausentar da sua comunidade, para fazer um caminho espiritual em comunhão com o Povo de Deus. E deve também exercitar uma fé prática, com obras de caridade e justiça social, como, por exemplo, participar da Campanha da Fraternidade que a Igreja realiza a cada ano neste tempo quaresmal”. Padre Nei de Oliveira Preto