Há muitos tipos de professores. Alguns já nascidos em famílias em que a educação é uma profissão comum. Alguns por uma
vocação incontrolável. Outros por se encantarem com algum professor logo cedo. E outros simplesmente por serem pegos
pelo destino em alguma das curvas da vida. Esther Maria Teixeira Corrêa, 56 anos, combina todos esses fatores. Neta de
dona Esther de Camargo Toledo Teixeira, grande ícone da educação socorrense que dá nome a uma escola e à Biblioteca Municipal, ela cresceu rodeada de tias professoras. Esther não só recebeu o nome da avó, como dela parece ter herdado também vocações e paixões pela música e pela educação, combinando-as na sala de aula. Confira a entrevista:
Quem a conhece sabe que você é apaixonada pela escola, mas nem sempre foi professora. O que a trouxe para a profissão tardiamente?
Tinha cerca de 4 anos quando entrei no ensino infantil, fazendo um ano aqui e outro em Serra Negra. Lá era muito diferente, trabalhavam já com muitas brincadeiras, tinha teatro, a gente cuidava das plantas. Sempre gostei muito de estar na escola,
era um ambiente que eu amava.
Amava mesmo. Sempre brincava de professora; minha mãe tinha uma máquina de costura que ficava em um móvel escuro
de imbuia, eu trazia giz da escola e ela deixava eu brincar de escolinha. Eu escrevia na máquina dela, como se fosse uma
lousa e colocava as bonecas e os ursinhos ali e dava aula para eles. Isso no 1º ano, com seis anos e meio. Era o meu sonho
ser professora.
Depois, na 2ª série, tinha uma professora que eu gostava muito e sempre tomava leitura. Uma vez ela faltou e
veio uma substituta. Não sei o porquê, talvez por ser uma professora diferente, eu demorei para ler e ela gritou comigo. Levei um susto e desde essa ocasião fiquei gaga, por muito tempo, até uns 17 anos. Acho que esse momento me fez deixar de
querer ser professora, aliado ao fato de todos em minha família trabalharem com educação.
Na 5ª série, quando eu ia ler a turma toda já ria, porque sabiam que eu não ia sair daquilo. Por outro lado, tive uma professora na 3ª série, a dona Therezinha Marcolino Pinto que me levava para cantar nas outras salas, porque sempre gostei de cantar e cantando não gaguejava. Então, no fundo eu ficava meio balançada, sabe quando você quer e ao mesmo tempo não quer…
Apesar disso, você fez magistério. Como foi sua experiência nesse curso e o que a fez não dar sequência à carreira
logo na juventude?
Sim, acabei decidindo, apesar de tudo, após o primeiro ano do Colegial, fazer o magistério. Foi mais forte do que eu, resolvi seguir. Logo no meu último ano de magistério fui convidada para dar aula na escola Formiguinha, quando ainda era ali
perto do Correio. Era como um estágio remunerado e dei aula para o Jardim II. Então, novamente me vi naquele ambiente
que eu amava, de minhas recordações de criança. Me apaixonei de novo e pensei: é isso mesmo que eu quero! Porém, no mesmo ano me casei e queria muito ser mãe; dez meses depois de casada engravidei e optei por me dedicar aos meus filhos.
Como foi a sua retomada?
Tomei outros caminhos para curtir a infância dos meus filhos, mas não podia ficar sem trabalhar. Sempre gostei de mexer com cabelos e maquiagem, sempre foram coisas que me atraiam, por isso eu e o Laerte abrimos o Ateliê. Em 2002, 18 anos depois de eu ter tido a primeira experiência em sala de aula, quando estava trabalhando com isso e com muitos clientes, minha irmã resolveu fazer o concurso. No último dia da inscrição ela foi lá no meu Ateliê e me pediu para fazer com ela.
Eu disse que não queria, pois eu nem sabia o que ia cair no concurso, não tinha material para estudar e estava bem no
salão. Ela insistiu muito, disse que seria bom pela experiência e queria que eu fizesse com ela por ela estar insegura. Então fui,
por ela. O interessante é que no período entre ter feito o concurso e sair o resultado, eu sempre passava em frente ao CMEI
e comentava com o Laerte: já pensou que legal passar no concurso e vir trabalhar aqui nessa escolinha… Achava que era uma
graça e perto de casa, porém não tinha a mínima ideia do que era o CMEI e de que naquela época não se podia escolher dar aula ali, era por designação. Ao final passei, bem colocada e fui chamada na primeira leva e também vim para o CMEI. Quando
estava saindo para a atribuição recebi a ligação da Maria Isabel Domingues, que era a diretora, me convidando para dar aula no período da tarde, parte diversificada que trabalhava com jogos, brincadeiras, música, artes… tudo o que eu de fato gosto!
Desde sua primeira turma no CMEI até hoje teve momentos marcantes?
O CMEI marcou muito a minha vida, é muito especial para mim. Dos 20 anos que retornei para a sala de aula, 18 foram no CMEI. Logo na minha entrada já foi marcante, pois peguei uma sala de Jardim II de ensino integral e a tarde as crianças já haviam passado pelas atividades do período da manhã, estavam cansadas e agitadas. Fazia 18 anos que eu estava fora de sala de aula, estava extremamente insegura, apavorada, chorava muito, perdi a voz. Estava a ponto de desistir. Porém, recebi um imenso apoio de três pessoas as quais serei sempre grata: a diretora Maria Isabel Domingues, a coordenadora Jurema Del Ciello e a Custodia Teresinha S Coelho, da sala de maternal, que trocou a sala por ela escolhida pela minha, mesmo antes de me conhecer. A Maria Carolina de Godoy também me ajudou muito. Por causa dessas pessoas, me adaptei rapidamente ao maternal.
Fiquei muitos anos só com o maternal, alguns anos com Jardim I e tinha trauma de Jardim II. Cada uma das minhas turmas me marcou muito, positivamente. Lembro de todos os meus alunos, seus nomes e características deles. Toda a minha trajetória no CMEI foi marcante… em especial, poder ver que crianças que foram suas alunas há 10 anos ou mais se lembram de você. Eu tenho alunos que já são moços e que me abraçam na rua, falam que se lembram de mim e têm saudades. Fazer a diferença na vida de uma criança e ser lembrada por ela até a vida adulta não tem dinheiro que pague.
Você recomendaria a pedagogia e uma profissão na área da educação para os jovens ou mesmo para pessoas mais velhas que queiram ter uma mudança em suas vidas?
Penso que uma pessoa para trabalhar com educação precisa ser apaixonada por isso. Mais do que apaixonada por transmitir
conhecimento, ela tem de ser apaixonada por aprender e a profissão de professor nada mais é do que um eterno aprendizado.
A gente está sempre aprendendo para poder passar para os alunos… Cada vez que a gente entra em uma sala de aula, que
a gente aplica uma metodologia para construir um conteúdo e aquilo não dá certo, aquilo faz a gente aprender, faz repensar o
que você fez e achar um outro caminho… outra metodologia, outra forma de trabalhar aquele conteúdo que atinja aquela
criança… que dê para aquela criança o que ela precisa… então, eu só recomendaria para quem tem um olhar atento, que
é capaz de olhar para a criança e ver aquele ser como um ser único, que está ali e que depende de você para desenvolver a
curiosidade, porque é isso: ser professor é despertar a curiosidade, é despertar o apetite por conhecer, por aprender…
Eu sinto que tenho isso, porém eu só recomendaria para as pessoas que tenham muita paixão… paixão em conviver com
o outro… paixão em aprender com o outro… e acho que tenho essa paixão porque eu tive muitos professores maravilhosos…
é até difícil mencionar apenas alguns deles… Aquelas professoras que me despertaram para as artes, as minhas tias,
a minha avó que foi o meu maior exemplo… Tenho muito orgulho de ser neta dela, meu pai me deu meu nome para
fazer uma homenagem a ela e acho que não foi à toa ter esse nome… Por muito tempo eu achava que era diferente
dela, mas hoje vejo que sou mais parecida com ela do que que eu imaginava. Tenho essa mesma paixão pela educação,
por aprender, por ensinar…
Como você vê a relação da música, da dança e das artes e do lúdico na sala de aula? Em que contribuem para a formação dentro e fora da escola?
Acho que as artes, todas elas, mas principalmente a música, são importantíssimas na escola. Foi justamente isso que me encantou quando criança, aquela escola na qual eu cuidava das plantas, fazia teatro, aquela professora que me levou para cantar nas outras salas… a música na minha vida ela sempre foi de muita ajuda…
Digo que a música me trouxe para onde estou hoje… quando eu tinha algum problema, quando eu não conseguia estudar eu escutava música para estudar… acho que a criança em si aprende muito através da música. Uma das coisas que a criança aprende primeiro é a cantar… Cantar, dançar, desenhar, pintar são modos dela expressar o que sente muitas vezes bem mais do que a linguagem oral… Você acaba conhecendo muito do seu aluno por meio das brincadeiras que envolvem todas essas coisas… O lúdico é a principal maneira da criança aprender… principalmente na educação infantil… Vejo que a educação infantil hoje vem sendo valorizada, se percebe que é talvez a fase mais importante da educação por ser ali que o caráter da pessoa começa se ser formado… Professor trabalhando junto com a família e a criança adquirindo tudo o que ela vai precisar para viver a vida adulta.
Algo mais?
Trabalhar com crianças é o maior privilégio que alguém pode ter. Elas são seres únicos, tem muito a ensinar para a gente, nos ensinam como conviver, como perdoar rapidamente, como levar a vida com leveza… Me divirto muito com o que eu faço, sou extremamente apaixonada por tudo isso, extremamente grata por poder trabalhar com crianças e por elas fazerem parte de meu dia a dia. E sou grata a cada uma delas que passou pela minha vida e pelo que me ensinou. Também sou grata por trabalhar nessa escola que eu amo tanto, que é o CMEI e com aquela equipe que eu acho extraordinária sob a direção da Arlete que é uma excelente diretora.