A possibilidade de um recomeço: a arte do tricô, é terapia, hobby e trabalho. A criatividade e as infinitas vertentes do artesanato mudam vidas. “Transformar”, para Selma Bombachini, tem ainda mais significado. De volta a cidade de origem, ela dedica-se a veia artística e apresenta sua primeira exposição no Museu Municipal.
A convite de Luka Fagundes e Marinilda Boulay, ela estreia neste sábado, dia 27, a exposição “Transformar”, que reúne obras autorais e também peças de sua mãe Amélia, de 90 anos e de seu pai, Agenor, de 97, que trabalha com cestaria.
Em nossa redação, Selma explicou como o artesanato, aprendido na infância, teve um papel importante na transformação de sua vida, aos 70 anos. “Sempre fiz cerâmica por hobby. A vida agitada não permitia dedicar mais ao artesanato e só presenteava alguns amigos com minha arte. De cinco anos para cá, eu comecei a pensar em mudar de ritmo; nesse meio tempo chegou a pandemia e vim para Socorro cuidar de meus pais, trabalhando em home office. Foi então que o tricô voltou e o uni com a cerâmica”, conta.
Em seu trabalho atual apresenta elementos modelados manualmente em paperclay (90% argila / 10% polpa de papel reutilizado), com queima elétrica a 1240º C e como suporte utiliza casulos, ninhos e tubos tricotados com fios de malha.
Prestigie!
“Transformar” estreia neste sábado, dia 27, às 15 horas, no Museu Municipal. Visitas: de terça-feira à sábado, das 9h às 17h – até 15 de julho.
A artista também participa da 3ª Edição da Vestir Cerâmica, exposição coletiva de arte cerâmica, que acontece em São Bernardo do Campo, com curadoria de Cibele Nakamura.
*Selma Maria Bombachini é socorrense, artista plástica ceramista, formada em Letras (Inglês), trabalhou como secretária executiva em grandes indústrias e atualmente no terceiro setor. Teve importante atuação na área de educação internacional (intercâmbio de alunos para o exterior). Frequentou o ateliê da arte-educadora/ceramista Angela Ziesemer em Florianópolis, de 1996 a 1999, onde teve o primeiro contato com a arte cerâmica. Desde então, tem se dedicado de forma autodidata, intuitiva e ininterrupta à modelagem manual em argila. Em julho de 2019 participou da Oficina PAPER-CLAY com Cynthia Gavião.
“Grandes Mulheres”
Ainda no Museu, no mesmo dia e horário, a artista plástica Tamara Nowascky Gonzales estreia a exposição “Grandes Mulheres”, com esculturas de cerâmica. Tamara é arteterapeuta, nascida em Blumenau/SC.
Sobre a exposição “Transformar”
Estamos em constantes transformações. Assim, proponho uma reflexão: o que em você ou à sua volta está em transformação neste momento?
Segundo o Xamanismo, o significado simbólico da cobra está ligado à transformação e ao poder da cura e regeneração. No caso da grande cobra, peça central desta mostra, tricotada por Amélia Bombachini (minha mãe, Socorrense, com 90 anos de idade), traz em si a transformação da vida dela, do entorno familiar e doméstico. Como a maioria das mulheres socorrenses, a partir da década de 1950 ela se dedicou à costura, bordados, nhanduti, crochê e tricô e assim foi até que a combinação da doença de Alzheimer com a deficiência visual não mais permitisse. Em 2020, durante a pandemia, ela reencontrou o tricô e naquele momento iniciou-se a mudança: ela se curou da ansiedade, tricotando todos os dias os quadradinhos que foram por mim unidos para transformarem-se em cobra, em arte colorida e lúdica. Com isso, o vagar sem sentido pela casa, a arrumação compulsiva de móveis, vasos e gavetas foram substituídos por horas de concentração no trabalho com os fios de malha.
A necessidade de material para trabalhar o artesanato, nossas artes, levou-nos à busca dos abundantes retalhos da indústria de confecção da cidade. Temos contado com a generosidade de empresários locais através da doação de resíduos que seriam descartados. Assim, os descartes transformam-se em fios de malha, que se transformam em arte têxtil carregada de significados e que é aqui apresentada. Trata-se de uma ínfima e simbólica contribuição na solução de uma questão que deve ser fonte de preocupações para as autoridades municipais do meio-ambiente.
Com a possibilidade de trabalhar em home-office, aliada à necessidade de estar com meus pais na tentativa de minimizar os riscos de contaminação pela Covid-19 e também para me proteger da ameaça, fez-me vim de mala e cuia para Socorro e por cerca de 6 meses tive um período em que reflexões sobre o sentido da vida e da arte despertaram em mim a semente de uma transformação interna. A modelagem manual do barro serviria para me “aterrar” naquele momento de tanto medo e incertezas. E logo, a presença dos fios de malha trouxe de volta o interesse pelo tricô, aprendido e deixado na infância. Esses dois elementos tão distintos pareciam querer conversar, a rigidez da cerâmica e a maleabilidade do tecido. A pesquisa então iniciada e que trago a público resultou em esculturas tricotadas em fios de malha que se assemelham a casulos, tubos que adquirem volumes através de amarrações e ainda ninhos, todos envolvendo e acolhendo os elementos de cerâmica. E cá estou, transformada, me apresentando como uma artista socorrense. Arte cerâmica + arte têxtil, juntas, transformando a vida.
Selma Bombachini – Maio/2023