Mãos de tesoura: a dedicação de 52 anos à profissão de barbeiro

Leitura obrigatória

Nascido em 26 de janeiro de 1928, prestes a completar 94 anos, 52 anos de profissão, lucido e atuante, crescido no Bairro dos Moraes, aprendeu a profissão aos 12 anos de idade.  Sr. Gregório conta que ele fazia a barba dos homens e até arriscava cortar o cabelo de alguns outros. Pedro Dini, Ernesto Dino, Arthur do Jordão são alguns dos nomes que Sr. Gregório lembra ter praticado a profissão de barbeiro ainda como aprendiz. Logo em seguida ao aprendizado empírico, Sr Gregório mudou-se para Pedreira onde também trabalhou como barbeiro e residiu por sete anos. Logo após ele se mudou para São Paulo onde trabalhou mais 15 anos, sempre na mesma profissão: modelando cabelos e cabeças. Essa é a história do barbeiro Gregório Satirio de Moraes, que no último dia do ano de 2020 decidiu fechar as portas de seu estabelecimento onde atuou por pouco mais de meio século. Chega ao fim a rotina diária de caminhada de cerca de 2 km, quatro vezes por dia e uma jornada de 8 horas de trabalho.

Quando foi que o senhor começou a trabalhar em Socorro?

Depois de longo tempo em São Paulo, eu decidi voltar e ficar perto da minha família, que residia nos Moraes e após trabalhar um tempo no sítio (sempre como barbeiro), eu comprei o Salão de Barbearia do Sr. Fortunato Sartori na Rua Marechal Floriano Peixoto 324, sendo que ele foi o iniciante do ponto comercial.

Como era a cidade nessa época?

A cidade era de “chão batido” e os carros de boi transitavam pelas ruas carregando sacarias de produtos para venda. Muitas vezes ajudei a desenroscar carroças que atolavam em meio à lama nos dias de chuva. Era outra realidade.

O senhor presenciou o surgimento da festa da Rua Marechal Floriano e Festas de Agosto?

Sim, todos os anos eu tinha que brigar com os barraqueiros para não deixar a barraca na porta do meu comércio. Afinal o cliente vinha para ser atendido e não podia entrar porque eles ocupavam toda a calçada. Mas foram anos de muita alegria, de muita coisa para lembrar.

Havia muita concorrência no segmento de barbeiro?

Quando eu voltei à Socorro já havia alguns barbeiros antigos e renomados na cidade como Robertinho Barbeiro, Joao Baldo, Nene Baldo, Pedro Neves, entre outros que já faleceram.

Como foi para o senhor acompanhar a mudança dos tempos da cidade?

Naquele tempo tudo era muito mais difícil, não tínhamos as facilidades que temos hoje. Eu comprei a barbearia em sociedade com Jarbas Dantas e depois comprei a parte dele. Mas foi tudo muito sacrificado, muito trabalho muita dedicação, e a cidade foi mudando e a gente foi melhorando. Passei por várias mudanças econômicas e crises e superei as crises porque eu comecei a diversificar e vender coisas. Então, minha barbearia virou um ponto de negócios, compra, venda e troca de coisas e animais. Eu vendia Mobilete, Garelli, relógios, entre outras coisas que pudessem me dar um dinheirinho extra.

Quem é a clientela do Sr?

Minha clientela maior sempre foi homens, mas havia mulheres que, às vezes, pediam para que eu cortasse o cabelo delas. A irmã do Luiz Marin vinha de Santos e pedia para eu cortar o cabelo dela. Cortei cabelos de muita gente de vários bairros como Camanducaia, Lavras e a geração mais nova veio por conta dos mais antigos. Hoje, eu corto mais de pessoas antigas porque estes cortes modernos com estrelinhas e desenhos eu não arrisco. Se errar o cabelo do cliente depois não dá para consertar.

Quais os cortes que o senhor mais gosta de fazer?

Hoje eles já não cortam mais como antes, mas era comum cortar Americano, Fuzileiro, Topetinho, Rabudo, Franjinha, Militar etc. Na hora de passar a máquina, eu já aviso o cliente porque pode devastar o cabelo do cliente.

O senhor já cortou cabelo de alguma autoridade da cidade?

Eu cortava o cabelo do delegado Dr Roberto, Lazinho Soldado, Isaurino Soldado, Padre Libero, Padre Jacob, do proprietário da Fonte Santa Maria, Sr. Toffi e outros mais.

Foi isso que fez o senhor ficar tanto tempo no mesmo ponto e tanto tempo na mesma profissão?

Além, de ser barbeiro eu também fazia comércio (vendia e comprava coisas) porque mesmo tendo uma boa clientela, os tempos eram difíceis, então minha barbearia era um ponto de encontro e de negócios.

Mas comprometimento com profissão, a credibilidade que  vai se construindo com o tempo, qualidade no atendimento leva à satisfação do cliente. Então a satisfação do cliente o faz voltar. Sem contar que, muitas vezes, eu já estava indo embora, já estava perto da igreja e eu voltava, reabria a barbearia e atendia o cliente.

Qual é a receita, o conselho ou a dica que o senhor daria para os novos barbeiros?

Atender bem o cliente, ter preço justo, agradar o cliente porque ele é razão para prosperar no trabalho.

Se o senhor pudesse fazer voltar o tempo o senhor escolheria outra profissão? 

Eu seria, de novo, barbeiro porque eu gosto do que faço e sempre gostei do meu trabalho. Quem faz o que gosta não trabalha, faz o que gosta porque faz com amor.

O senhor lembra-se de momentos difíceis como esta pandemia?

Sim, tivemos muitas crises econômicas, crise de saúde com a febre dos bexiguentos a pandemia de varíola, época em que precisávamos estocar alimento, veio a revolução de 1932, a Segunda Guerra Mundial, o invento da televisão, o uso da telefonia, os carros que modernizaram e outras mudanças. Naquela época era muito difícil ter dinheiro, difícil guardar dinheiro e não desperdiçávamos nada .

O senhor já ensinou a profissão para alguém?

Sim, eu ensinei o Eurides Barbeiro (já falecido) e ele em 15 dias aprendeu a profissão e teve uma boa clientela.

O senhor corta o cabelo de muitos, mas quem corta o cabelo do barbeiro Gregório?

O meu cabelo, depois de muitos caminhos de rato, eu acertei um bom barbeiro. Ele é o Aimberé e foi sócio/parceiro do finado Eurides.

É verdade que o senhor esta entregando o ponto comercial?

Eu já entreguei o ponto comercial porque com essa pandemia e com as despesas operacionais eu não consigo ficar neste ponto. Eu quero continuar trabalhando, mesmo sendo na minha casa. Mas eu não posso manter o ponto e  “pagar para trabalhar”.  Se puder eu quero morrer trabalhando, esse é o meu desejo. Então eu vou atender na minha casa e quem precisar, pode me procurar no meu endereço residencial.

Sr. Gregório, quem quiser cortar o cabelo com senhor então deve procurar o senhor em qual endereço?

Quem quiser cortar o cabelo ou aparar a barba pode me encontrar de 2ª a sábado das 8h às 11h e das 13h às 18h à Rua Benedito Castro de Oliveira, 27 – Vila Nova ou pode agendar pelo telefone 3895-3573.

Giceli Guimarães Fleming
Especial para O Município / Colaborou: Renato Nascimento

Gregório e Giceli Fleming

 

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