O seminário “A importância socioambiental da região do Serrote”, realizado no dia 2 de dezembro, na Câmara de Socorro, contou com a presença de produtores da região e de pessoas ligadas a ONGs voltadas ao meio ambiente, além de autoridades do executivo e legislativo socorrense.
Além das palestras, foi apresentado e comemorado o projeto de lei que cria o Distrito Agroturístico Sustentável Caminhos do Serrote. O distrito é composto totalmente pelos bairros do Serrote e Bom Retiro, e com grande parte do bairro Cafundó, e parte importante dos bairros Lavras de Cima, Juncal e Cubas. Esses bairros estão localizados em variações de altitude que vão de 1500 metros na parte mais alta, descendo até os 700 metros, na parte mais baixa, uma variação considerada importante para a biodiversidade.
O prefeito Ricardo Lopes falou da alegria de, após meses de trabalho entre o poder público e a comissão designada pela associação, poder chegar a um consenso e, dessa forma, está encaminhando à Câmara Municipal, para ser votado. Para ele, o projeto é um marco e mostra a importância do trabalho da sociedade civil organizada que deseja preservar sua região, garantindo meios para o desenvolvimento.
Junto com presidente da Associação do Serrote, Eduardo Bovi, foi feita a entrega do projeto de lei ao presidente da Câmara, Willhams de Moraes, sob aplausos dos presentes, que há algum tempo esperavam por essa ação, visando dar diretrizes legais e ajudar no crescimento econômico e na preservação ambiental dos bairros envolvidos no Distrito do Serrote, o primeiro dessa modalidade no estado de São Paulo.
Eduardo Bovi ressaltou a importância desse seminário realizar-se na Casa do Povo, em um trabalho conjunto da Associação recém-criada, com a população do bairro. Agradeceu e ressaltou a presença das pessoas da zona rural. Disse que por meio desse seminário será mostrada a importância socioeconômica do bairro, e quão importante será expandir essa iniciativa para outras regiões do município.
O presidente da Câmara se comprometeu a somar esforços e boa vontade para as pretensões expostas no seminário. “É dever do poder público incentivar, auxiliar e oferecer os meios que estiverem ao seu alcance para viabilizar a construção deste pólo econômico”.
Também esteve presente e manifestou seu apoio a iniciativa o deputado estadual Barros Munhoz. De acordo com o parlamentar, a preservação do meio ambiente é um ato contínuo e necessário. Reforçou, também, a importância dos municípios se organizarem para a preservação de áreas de mata e da fauna local.
Seminário aborda importância socioeconômica da região e faz alerta
João Paulo Ribeiro Capobianco apresentou dados e fatos sobre a região do Serrote no contexto da preservação socioambiental. Biólogo e doutor em Ciência Ambiental pela USP, ele participou da fundação e direção de várias organizações, como a Fundação SOS Mata Atlântica; foi secretário nacional de Biodiversidade e Florestas, e secretário executivo do Ministério do Meio ambiente.
Capobianco disse que a região do Circuito das Águas é muito especial, e Socorro é parte importante dela. Os nove municípios juntos possuem alta biodiversidade, uma área de Mata Atlântica de 30.257 hectares, e Socorro possui 6.600 desse total. Esse conjunto de municípios está dentro de duas importantes bacias hidrográficas, a de Mogi Guaçu e PCJ, que contribuem para o abastecimento de água do estado e da região metropolitana de São Paulo. “Isso significa que produzimos a água que abastece a maior cidade da América Latina”, ressaltou ele, que também é empresário e produtor de café orgânico no bairro Serrote.
De acordo com o Instituto Geográfico e Cartográfico de São Paulo, essa região possui 216 nascentes contabilizadas, mas de acordo com habitantes da região esse número é bem maior.
O distrito possui 179 propriedades e, destas, 3 são propriedades grandes, com área acima de 300 hectares; 13 (7%) são médias e 163 (91%), são pequenas propriedades, com os proprietários e suas famílias que moram no campo. “Isso é fantástico, quase não existe mais! Temos uma diversidade muito grande. Temos de manter essas pessoas no campo, fazê-las crescer para que possam produzir, gerar emprego e renda”, destaca.
O distrito é formado, ainda, por 5000 hectares de vegetação nativa, com 1.600 hectares (31%) em situação excelente, e 1070 hectares (21%) de agricultura. Entre maio de 2019 e novembro de 2021 essa área foi muito degradada, com ampliação de construções e moradias.
“Temos uma oportunidade ímpar de desenvolver um projeto único, com o compromisso dos moradores. Podemos obter recursos para preservar, obter apoio para a melhoria ambiental, estimular o turismo rural, fazer dessa área um exemplo para Socorro e demais cidades e estados do Brasil”, encerra.
Importância para a bacia hidrográfica do Rio Mogi Guaçu
Mariana Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil, explicou que a bacia do Rio do Peixe encontra-se na região do Serrote, considerada de alta densidade de drenagem, com muitas nascentes e córregos, comuns numa região montanhosa, com uma conexão muito forte entre precipitação e vazão.
“Chove e rapidamente aumenta a vazão dos rios. E o inverso também acontece: seca e rapidamente os rios secam. É nesses tipos de rios que é mais importante preservar as áreas ciliares. Hoje a região têm menos da metade de suas áreas de preservação permanente com cobertura de vegetação nativa, cerca de 40%, e formam grandes fragmentos de mata nativa. Se essa vegetação for restaurada, o potencial de impacto será muito rápido, pois em áreas de 3 anos de plantio já se nota impacto na qualidade e quantidade de água”, enfatiza.
Importância biológica das aves: estudo identificou 267 espécies
Gustavo Malacco é biólogo especializado no estudo das aves, tendo realizado levantamentos em todos os biomas brasileiros. Entre 2018 e 2019, em 4 campanhas realizadas no Serrote, foram identificadas espécies, entre elas: Urubu Rei, Águia Cinzenta, Gavião Pega Macaco, Papagaio Verdadeiro, Coruja Listrada, Tucano de Bico Verde, Picapau Rei, Chorão Carijó, Grimpeiro, entre outras ameaçadas de extinção.
O ambientalista conta que, na região do Serrote vivem cerca de 360 espécies, e que é necessário restaurar a mata, para a sobrevivência delas. Em seu estudo, 267 foram fotografadas, e acredita que haja muitas outras espécies não catalogadas.
“O resultado da preservação em nada vai prejudicar as atividades econômicas da região, mas vai, sim, enriquecê-la ainda mais, por exemplo, com o acréscimo de uma atividade turística rendável, que cresce no mundo todo, que é a de observar e fotografar as aves”, encerrou ele.
Ações de recuperação
Ana Paula Balderi bióloga e fundadora da Copaíba, falou sobre as “Ações para a recuperação e restauração florestal da região do Serrote” e ressaltou a necessidade de união. “Todos têm de proteger suas áreas, porque não adianta um proteger e o vizinho não respeitar as bacias”. Também alertou sobre a questão dos motociclistas, que entram dentro das propriedades, abrindo clareiras, sem autorização ambiental, além de passar por cima de nascentes e córregos.
Outro alerta é sobre o parcelamento do solo, que também traz um problema gigantesco, não só no Serrote, mas também em outros bairros. “Imaginem uma propriedade com todos os cuidados de proteção e conservação, e um vizinho vai lá e picoteia toda a propriedade, vende os lotes, e cada novo proprietário abre um poço artesiano, vem outro, outro, e a área acaba com 20, 30 poços, mexendo com todo o lençol freático, trazendo prejuízo a todas as propriedades”. Ana Paula acha muito importante repensar essa venda de lotes sem planejamento, valorizando os que estão fazendo tudo dentro das normas legais e aprovadas por órgãos competentes.
“Precisamos pensar no equilíbrio social, econômico e financeiro que a gente consegue com a conservação, que só traz benefícios para vocês, que são os produtores de água”, encerra a bióloga, sob aplausos dos presentes.
Mário Mantovani encerrou o ciclo de palestras abordando a “Importância das iniciativas da sociedade para a proteção da Mata Atlântica”. Geólogo e diretor da SOS Mata Atlântica, ele lembrou que o Plano Municipal da Mata Atlântica está na Constituição e precisa ser pensado no que se quer para o município. “Qual a melhor lei municipal para o bem comum, e o que está ocorrendo nesse seminário não é só para o grupo do Serrote. O Serrote é referência, o pessoal conseguiu se articular entre eles, é um exemplo que deve ser seguido, que outros grupos também se articulem e possam ter essa experiência”, aconselha o palestrante.